Trabalhar em casa com filhos. Com orientações de isolamento social para barrar o contágio pelo coronavírus, muitas empresas estão adotando o home office (trabalho em casa) para seus funcionários. Ao mesmo tempo, escolas e creches fecharam ou estão trabalhando com aulas à distância. E, nesse cenário, pais – e principalmente mães, já que a divisão do trabalho doméstico raramente é igual – estão tendo de encarar as dificuldades de manter a produtividade com as crianças em casa.
Tem muito a ser dito sobre a idealização do trabalhar de casa e maternidade, mas isso fica para a próxima coluna. Hoje, trago dicas práticas para fazer do limão uma limonada (ou uma caipirinha, se preferir). Todas essas dicas valem sempre, mas valem muito mais em tempos de crise como os que estamos vivendo hoje.
Dica 1: Avalie suas condições e não se compare aos outros
Você tem filhos? Quantos? Que idade? Com quem eles ficarão? É absolutamente normal e natural que você esteja exausta e que seja difícil render quando está em privação de sono e exausta, tentando equilibrar o cuidado das crianças com o trabalho, ainda por cima em confinamento, tensa com o seu futuro e de seus filhos.
Ninguém sabe o que vai acontecer ou passou por algo parecido anteriormente. Estamos todas confusas e ansiosas em alguma medida, mas as condições materiais de cada uma terão impacto na forma como iremos viver este momento também.
Compreender a estrutura é o que vai nos permitir agir sobre ela: 1) tomando consciência dos nossos privilégios e oportunidades; 2) não reproduzindo discursos que servem apenas para oprimir outras mulheres; 3) contribuindo, na medida dos nossos privilégios com a mudança do sistema; 4) abrindo portas e facilitando o caminho para outras mulheres quando estamos mais à frente na caminhada; 5) agindo concretamente dentro da realidade e não da ilusão vendida para romper barreiras e abrir caminhos para nós e para as que vierem depois de nós!
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Dica 2: Autoconhecimento
O que funciona melhor para você? Em que horários você é mais produtiva? Do que você precisa no seu ambiente físico para render mais? Somos diferentes, temos necessidades únicas e peculiares, mas o mundo quer nos colocar todas em caixinhas e dizer que devemos trabalhar das 9h às 18h, almoçar em uma hora, dormir 8h (risos), fazer exercícios e aplicar os 5S (uma metodologia de produtividade).
Eu, por exemplo, rendo mais a partir das 11h, preciso de 10h de sono, mas se tenho 6h já to dando pulo de alegria. Sempre gostei de trabalhar em casa e consigo trabalhar no sofá, no escritório e na cama com a mesma facilidade. Mas isso é o que funciona para mim.
“Mas Tayná, então tudo bem a minha vida estar uma bagunça e eu trabalhar em uma bagunça organizada e não estar fazendo exercício físico?”. Sim e não! Na verdade, a pergunta deveria ser: isso está te fazendo bem? Você está satisfeita e realizada? Tem atingido os objetivos que se propõe e realizado coisas que te preenchem? Se sim, se tá tudo bem!
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Se não, a inexistência de fórmulas e de receitas do sucesso não quer dizer que você precisa se acomodar na frustração. Autoconhecimento dá um trabalho do cão e dói pra caramba quando não tem resposta pronta e o trabalho tem que ser feito por nós mesmas, mas ele também traz consigo amor próprio, autoestima e conexão com a nossa vulnerabilidade.
Neste ponto, a crise toda nos apresenta uma oportunidade incrível de olharmos para dentro e nos conectarmos com aquilo que não estamos prestando atenção na correria do dia a dia.
Dica 3: Protagonismo – estabelecer prioridades e escolher sem culpas
Quando falo de questões estruturais e que não existe fórmula pronta, não é para dar desculpas ou não assumir nossa responsabilidade pelas nossas frustrações. A vitimização e o autoengano são a receita da frustração, da baixa autoestima e do fracasso. Precisamos exercitar a habilidade de definir prioridades e fazer escolhas coerentes com elas.
Reflita sobre o que é inegociável e escolha suas batalhas. Isso é protagonismo.
Protagonismo é assumir responsabilidade pelas nossas ações e devolver a responsabilidade dos outros pelas deles e livrar-se de culpas que definitivamente não são nossas (principalmente o imponderável!). Para isso:
1) Se faça perguntas e avalie com franqueza se você não está buscando justificativas ao invés de assumir e bancar suas escolhas (ainda que dentro de um rol reduzido delas) e se colocar em um posicionamento defensivo e derrotista. O que é mais importante para mim neste momento? É manter uma boa alimentação ou que meu filho tenha menos exposição a eletrônicos? É manter o meu trabalho ou aproveitar para estudar novos caminhos?
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2) Se conhecer técnicas e ferramentas de gestão do tempo é bom para todo mundo, para mães fazendo home office é fundamental. Existem centenas de recursos práticos que ajudam neste sentido, inclusive disponíveis online e gratuitamente com dicas muito simples, mas que fazem toda a diferença (eu mesma no meu canal no Youtube tenho uns vídeos sobre isso – da época pré-crise, é claro!).
3) Tire o foco do que não depende de você. Ao invés de se preocupar com o que foge ao seu controle gaste sua energia perguntando-se o que você pode e quer fazer dentro desta situação e como fazê-la ser um pouco mais leve.
Dica 4: Autocuidado
“Cuidar de mim mesma não é auto indulgência, é autopreservação, e isso é um ato político”, disse a escritora e ativista Audre Lorde. Essa frase, de uma das feministas que eu mais admiro, guia muito da minha existência enquanto mulher, feminista, mãe e militante.
Cuide de você! Lembre-se da máscara de oxigênio: se você não estiver bem não poderá ajudar mais ninguém. Reconhecer que você precisa de tempo longe de seus filhos (ainda que seja no banheiro), que precisa descansar ou apenas gozar de silêncio (ainda que seja com um fone no ouvido!) para pensar (e sim, trabalhar também) não faz de você uma mãe pior, muito pelo contrário.
Cuidar de você não a torna uma pessoa egoísta, faz de você alguém inteligente e estratégica. Especialmente em tempos tão estressantes e imprevisíveis como os que estamos vivendo. Está tudo bem pensar que tudo seria mais fácil sem filhos agora. Seria mesmo e isso não tem nada a ver com amor ou relações.
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Dica 5: O tédio e o ócio são nossos amigos
Ficando em casa, precisamos aprender a lidar com o tédio e o ócio, esta é uma excelente oportunidade para ensinarmos isso também às nossas crianças, tão hiper estimuladas no dia a dia. Curtir o silêncio, a própria companhia ou ainda conversas à toa são exercícios que podem ser muito úteis agora e que servem para a vida inteira. Nada fáceis eu sei.
As grandes ideias surgem dos momentos de descompressão do cérebro e esta pode ser uma excelente oportunidade de ajudar as crianças da era tecnológica a redescobrir o silêncio e a aprender a lidar com o tédio. Pode ser um dos melhores aprendizados no meio desse caos.
Dica 6: Eles precisam de muito menos do que imaginamos
A dica mais óbvia, e também a mais difícil de implementar muitas vezes (ao menos para mim) é a de que mais do que apetrechos, crianças se entretêm com a nossa presença. Brincar de esconde-esconde, de stop, de caça ao tesouro, cozinhar, cabaninha de coberta, não importa muito o quê, mas com quem e como. E esse é o mais difícil em um momento como este em que nós, adultos, estamos estressados, preocupados e ansiosos. Acabamos ficando impacientes e distantes emocionalmente e, por isso mesmo, é também um chamado para nós: um chamado para a presença.
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Dica 7: Não se cobre por afrouxar as regras
Estamos todas estressadas e ansiosas com a situação. Achar que este será o grande momento de colocar toda a vida em dia, arrumar todas as pendências, fazer 370 atividades manuais com as crianças e ainda acompanhar os cursos que Harvard e MIT liberaram juntamente com o desafio de yoga da blogueira que você gosta, é a receita perfeita para a frustração e a culpa.
Muitos dirão para manter a rotina. Eu acredito que este não é o momento de maiores cobranças e sim de procurar alguma leveza em meio à aridez. Afrouxar (e não eliminar) as regras por alguns meses não vai prejudicar a educação de uma vida toda e pode te poupar de muito estresse. Um doce a mais, dormir até um pouco mais tarde, comer no sofá uma vez ou outra, são negociações que podem ser muito úteis agora.
Inclusive para você. Se cobrar menos, e dos outros também, pode fazer toda a diferença para manter a sanidade mental.
Dica 8: Mantenha o otimismo e a energia, dentro do possível
Nada será melhor para os nossos filhos – e nós mesmas – neste momento do que manter um otimismo consciente. Isto não significa “entregar pra Deus”, desencanar daquilo que está sim em nossas mãos, como os cuidados de higiene e práticas sanitárias necessárias, incluindo #ficaremcasa, muito menos acreditar na fake news do gargarejo.
Otimismo não é ingenuidade e nem ignorância, mas permitir-se rir de si mesma de vez em quando. Otimismo é poder gargalhar ao ouvir seu bebê rindo gostoso mesmo que tudo ao nosso redor esteja um caos. Otimismo é compreender que o controle da sua vida, na verdade, jamais foi totalmente seu e que sim, há muita coisa que pode ser aproveitada neste momento.
Manter o otimismo passará calma, tranquilidade e serenidade para as crianças se sentirem seguras para enfrentar este enorme desafio.