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Agnes Arruda
30 de janeiro de 2023

Saúde é direito. Gordofobia é preconceito

Racistas gordofóbicos NÃO PASSARÃO

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gordofobia

Foi de mãos firmemente dadas com Andreia, uma mulher preta e gorda que nos primeiros dias de janeiro perdeu seu filho para a gordofobia, que caminhamos. Andamos avenida Paulista adentro no primeiro domingo ensolarado deste esquisito verão frio e chuvoso de  São Paulo em 2023. 

O sol queimava a nossa pele, coberta de preto e luto. Caras tristes, fechadas, muitas zangadas, pelo que a gente se recusa a aceitar, mas não consegue evitar sentir: dor, raiva, tristeza, ódio, pesar, indignação. Tudo isso junto à certeza: a gordofobia, em especial a mascarada de preocupação com a saúde, tem que acabar.

Vitor tinha 25 anos, era preto e pesava 190 quilos. Teve três paradas cardíacas enquanto esperava por atendimento médico. Mas, nenhuma das três unidades de saúde para as quais ele foi encaminhado tinha sequer uma maca que comportasse seu corpo, o acolhesse e evitasse o pior.

O jovem negro morreu em frente ao terceiro hospital que buscou ajuda, dentro de uma ambulância do SAMU, porque nenhuma das unidades foi capaz de socorrê-lo. 

Não bastou a negligência daqueles que chegam inclusive a declarar “guerra contra a obesidade”, no segundo país que mais faz cirurgias bariátricas no mundo. A mãe de Vitor, Andreia, teve que enfrentar outro absurdo: no caixão de seu filho, foi usado lixo para acomodar o corpo a ser velado e enterrado. 

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Somada ao racismo, a dor que Andreia foi obrigada a passar tem nome e sobrenome: gordofobia estrutural. O preconceito, que entre tantos outros pilares se estrutura na ideia de que pessoas gordas, apenas pelo peso, são doentes, fez mais uma vítima.

“Mas obesidade não é doença?”, costumam perguntar pessoas que ainda não pararam para pensar que toda gente, independente do tamanho, tem o direito de atendimento à saúde. É constitucional. Acontece que, ao generalizar o peso como comorbidade, generaliza-se também toda uma sorte de ideias pré-concebidas sobre pessoas gordas.

Preguiçosas, desleixadas, sujas e sem força de vontade são apenas algumas delas, mas que, associadas à moralidade vigente, atribuem, além do valor estético, valor ético aos corpos. Assim, o corpo magro seria bonito e certo; o corpo gordo, feio e errado.

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Uma vez considerado errado, o corpo gordo também não é considerado digno. E, como em um expurgo coletivo, passa a ser totalmente vigiado e punido pela ousadia da simples existência.

A punição vem de várias formas, dos relacionamentos familiares e amorosos às políticas públicas de Estado. Políticas que não consideram, por exemplo, a diversidade dos corpos na hora de garantir infraestrutura e insumos para atender quem, na teoria, mais precisa. Mas só na teoria. A prática é a que a gente viu no caso do Vitor: desrespeito e indiferença.

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Andreia, que perdeu o filho para a gordofobia, conheceu na dor essa causa que ainda não havia furado a bolha para chegar a uma mãe gorda, preta e periférica de São Paulo. No entanto, foi ela quem, no seu luto, nos acolheu e abraçou. 

#JustiçaPeloVitor é o que pedíamos na caminhada. É por ele. É por todas nós.

* As opiniões aqui expressas são da autora ou do autor e não necessariamente refletem as da Revista AzMina. Nosso objetivo é estimular o debate sobre as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

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