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5 de setembro de 2019

“Fiz um aborto porque acho que maternidade não é brincadeira”

O Divã de hoje é anônimo porque aborto ainda é crime no Brasil

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“Eu fiz um aborto.

Eu tinha 25 anos, descobri a gravidez com duas semanas e para mim era difícil dizer que eu estava grávida. Eu não me sentia grávida e, com toda a certeza do mundo, não queria isso naquele momento da minha vida. Na verdade, eu sempre repeti que, além de não querer um filho cedo, talvez não quisesse nem mais tarde… Iria depender muito do contexto e da estabilidade da minha vida emocional, financeira e amorosa. Mas aconteceu…

Minha menstruação estava atrasada havia três dias. Eu namorava há uns 4 anos e, durante todo o namoro, eu não tomei pílula. Nunca me adaptei. Controlava meu ciclo anotando todos os períodos e sintomas de cada fase e usávamos camisinha. Sempre fomos muito responsáveis.

Duas semanas antes de isso acontecer, eu e meu namorado estávamos juntos e analisando o meu ciclo, estando fora do período fértil e, fora da margem de erro das oscilações que o período fértil costuma ter, decidimos arriscar. Para nós, de acordo com meu controle de mais de três anos percebendo meus ciclos, seria um risco muito baixo. Transamos sem camisinha e sem coito interrompido.

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Duas semanas depois, com três dias de atraso da minha menstruação, comecei a suspeitar que isso poderia estar acontecendo comigo. Fui para a casa de uma amiga, fiz um exame de farmácia e deu um resultado estranho: meio positivo, meio negativo.

Voltei na farmácia e comprei outro teste, um mais caro que dizia até as semanas. Resultado: positivo; grávida de 2 a 3 semanas.

Bateu certinho com o fim de semana em que eu e meu namorado estávamos juntos. Mesmo com todo o controle e cuidado, aconteceu. Erramos. Qualquer corpo sempre está sujeito as mudanças e nesse último mês comprovei que minha ovulação resolveu vir fora do período esperado… Nos ferramos. Me ferrei.

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No início foi um choque. Eu não sabia o que pensar, fazer, nem falar. Minha amiga ficou mais confusa do que eu. Meu namorado ainda tinha fé que o exame de sangue daria negativo. Já eu não; no fundo, eu sabia, fazia todo o sentido para mim, meu corpo já estava me mostrando que algo estava diferente. No dia seguinte, pela manhã fiz o exame de sangue. Resultado: positivo.

Daí em diante só me dediquei a pesquisar o que fazer: eu moro no Brasil, um dos países onde abortar é crime.

Liguei para uma amiga que já tinha abortado, peguei contatos e conversei sobre essas experiências. Li muito na internet, principalmente materiais oficiais sobre saúde e segurança na autoindução de um aborto disponibilizados por ONGs que lutam pelo direito e pela vida das mulheres.

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Fiquei muito grata por terem tantas pessoas e organizações trabalhando por essas causas. Me senti apoiada e informada por essas mulheres.

Li também alguns relatos de mulheres que abortaram. Conversei muito com meu namorado e com minhas amigas que sabiam. Eu não tive dúvida em momento nenhum: eu só queria resolver isso o mais rápido possível e voltar a me dedicar ao meu trabalho e à minha vida com a minha mente em paz. Eu tinha acabado de me formar na faculdade e estava lutando para conseguir me encontrar no mercado de trabalho e construir uma carreira.

Eu consegui resolver tudo muito rápido. Descobri que estava grávida em uma sexta-feira, na segunda liguei para a clínica e marquei o aborto, que aconteceu na quarta. Foi uma turbulência de sentimentos e angústias que durou seis dias.

Tenho total consciência dos meus privilégios. Moro no Brasil e fiz um aborto relativamente seguro menos de uma semana depois de descobrir que estava grávida.

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Quantas mulheres não têm esse privilégio? Quantas mulheres se veem sem opção diante de uma gravidez indesejada? Quantas mulheres não têm informação sobre prevenção e/ou sobre decidir sobre seu corpo e sua vida sexual?

Que um dia todas as mulheres exerçam seus direitos de decidir sobre seu corpo e sua vida. Para mim, conseguir resolver isso de maneira rápida e segura foi incrivelmente libertador. Eu não estava pronta para ser mãe e nem estava dentro dos meus planos tão cedo.

Maternidade não é uma obrigação. E nem uma missão que toda mulher deve viver. Ainda mais sem planejamento. Maternidade não é brincadeira. Envolve a vida de uma mulher e a responsabilidade de colocar outra vida no mundo. Isso não pode continuar sendo tratado com a hipocrisia que o nosso Estado e grande parte da nossa sociedade tratam essa questão.

Que nossa luta continue e siga adiante cada vez mais forte.”

O Divã de hoje é anônimo porque aborto ainda é crime no Brasil


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