A parte boa de ter uma coluna é que você pode escrever o que te der na cabeça. E hoje me deu na cabeça que não quero falar de sexo e sim de relacionamento. Claro que, no fundo, tá tudo relacionado, mas hoje eu quero falar de amorzinho, nada de putaria, nem de gênero, pra ser sincera.
Queria começar essa conversa retomando as modernas e descoladas palavras de um dos hits alternativos do momento: “eu nunca senti desapego por ninguém, com você experimentei, não resisti…”
Mas não dá. Até porque eu juro que ainda não consegui entender a letra dessa música. Duda Beat, me explica.
Então vou começar esse papo denunciando o quanto sou antiquada musicalmente e chamar Vanessa da Mata: “Tudo que quer me dar é demais, é pesado, não há paz. Tudo que quer de mim: irreais, expectativas desleais”.
É que estava pensando sobre como quando se relaciona, a gente quer coisas do outro e também quer dar coisas para o outro. Daí me bateu que esse hit do passado, que sempre achei cafona, traz um bom tanto de sabedoria.
Vanessa tava lá, se sentindo sufocada pelo que a outra pessoa fazia e ao mesmo tempo ciente de que não podia dar o que o outro queria e o que fez? Falou: “aceita a migalha que tenho pra te dar e para de encher”? Não. Terminou. Musicalmente ainda. Espero que um dia alguém termine comigo com música…
O ponto é: acho de uma maturidade enorme reconhecer que para um relacionamento (monogâmico, aberto, fechado, livre, poliamoroso, o que for) não basta amor ou paixão, tesão e esforço. Precisa também de uma convergência de quereres e disposições.
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Por muito tempo eu achava que o relacionamento foda era aquele em que você se esforçava para dar o que o outro quer e a outra pessoa se esforçava para te dar o que você quer. Não só eu. Esses dias mesmo ouvi de uma amiga que “tem que deixar claro que é preciso te dar mais”.
Sei lá. Tem mesmo?
Acho que o negócio é deixar claro o que quer. E deixar claro o que pode dar. Daí tem que combinar da outra parte querer receber o que você quer dar e estar disposta a dar o que você quer receber.
Se tivesse rolado esse encontro, Vanessa cantaria: “Tudo que quer me dar é delícia, é gostoso, satisfaz. Tudo que quer de mim tem a ver, expectativas bem reais”. PS: vou com certeza sentir vergonha de ter escrito isso em algumas semanas.
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O foda é que é difícil acontecer isso. Às vezes rola o encontro de almas, rola um tesão maluco, mas não rola a sintonia das entregas (Alô capitalismo!). E no desespero da paixão, a gente acaba achando que o melhor é cobrar. O outro acaba achando que o melhor é se esforçar. Ou o contrário: um acaba aceitando menos do que quer e o outro acaba pedindo isso.
A gente já se esforça para pagar as contas, para chegar na hora no trabalho, para guardar dinheiro para se aposentar aos 97 anos, para tentar conquistar o mínimo de direitos e respeito. E cobrar, então? Se já é insuportável cobrar um pagamento por um trabalho que você fez e que já devia ter recebido, imagina cobrar um carinho que na verdade ninguém te deve e você só está cobrando porque é o que você quer. O amor não precisa ser um negócio que exige esforço.
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Imagina, toda semana ter que botar na checklist:
- Pagar o convênio
- Comprar ração pras gatas
- Arrumar a gaveta do armário
- Demostrar todo meu amor e afeto pro mozão/ fingir que não sinto falta de mais afeto e amor do mozão
Socorro!
“Esses jovens não querem nada com nada”, diriam as tias e avós lendo isso aqui. Não tiro a razão delas. Talvez eu não queira mesmo que os relacionamentos sejam mais uma tarefa da minha vida. Talvez eu ache que é melhor estar só do que ficar pesando, cheia de expectativas irreais e frustrada, ou ainda sendo cobrada pra fazer coisas que simplesmente não sinto vontade.
Olhando por esse lado, talvez eu até esteja experimentando o tal do desapego da Duda Beat.