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Agnes Arruda
27 de fevereiro de 2023

Chegando aos 40

Reflexões de uma mulher millennial

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mulher millenial

Nasci em agosto de 1984, o que significa que em breve completo 39 anos. Viver os anos 2020 tem sido uma experiência incrível. A gente tem desconstruído tanta coisa, ressignificado mais uma porção de outras. Hoje, as mulheres de 20 vivem numa sociedade que, mesmo marcada pelo capital e pelo patriarcado, está mais aberta à discussão. Há 20 anos, as coisas não eram bem assim.

Na faculdade de Jornalismo, em 2005, resolvi que meu trabalho final de curso seria um jornal-mural, que ficaria nas portas das cabines dos banheiros públicos femininos. “O Bidê” – como batizei o veículo – era um espaço para questões que rondavam nosso universo naquela época, e que não tinham outro lugar, senão a porta do banheiro, onde temos maior intimidade para falar.

Para muita gente, a ideia foi revolucionária. E olha que uma das matérias trazia a opinião de um cara sobre nossas calcinhas. Pois é. Não me orgulho, mas não me culpo. Na época, mobilizei parte da universidade com o projeto, inclusive o laboratório de Desenho Industrial, porque precisava construir um suporte para prender o jornal nas portas do banheiro. Lembro direitinho quando o técnico do laboratório comentou com o colega, em tom de fofoca, mas alto o suficiente para que eu ouvisse: “Olha a feminista ali!”

Comentários como esses continuam acontecendo. Em 2005 me senti quase ofendida. Hoje, me ofende quem duvida do meu feminismo, não quem aponta o óbvio. 

O desconforto de quase 20 anos atrás fazia todo sentido. Depois da segunda e da terceira ondas do movimento feminista, nos anos 1960 e 1970, as mulheres dos anos 1980, como minha mãe, estavam se matando em jornadas triplas para dar conta do espaço conquistado no mercado de trabalho e dos afazeres domésticos. Elas “trabalhavam feito homem”, mas tinham seus “afazeres de mulher”.

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Do mesmo modo, o patriarcado rapidinho deu um jeito de tirar vantagem da libertação sexual feminina. Com isso, as adolescentes dos anos 90 cresceram influenciadas por revistas que falavam abertamente sobre sexo, mas só para apresentar a milésima primeira forma de agradar seu homem na cama. Sem falar nas questões estéticas.

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Nos anos 1990, queriam nos passar a ideia de que a luta feminista estava superada. “Vocês já votam, trabalham e fazem sexo! Querem mais o quê?” Lógico que tudo isso foi conquistado ao gosto do capital e do patriarcado. Mas a real é que pegava meio mal sair por aí se dizendo feminista. Era quase como uma rebelde sem causa.

“Feminista, não. Feminina!”, respondi para o cara que fez a piadinha na faculdade. Hoje, percebo o horror dessa frase que parece ter saído da boca da Damares Alves, se já não saiu, nas inúmeras vezes em que a ex-ministra nos deu a certeza de que a luta não terminou. A verdade é que somos muitas mulheres de (quase) 40 anos, vivendo no auge de toda essa discussão, mas com a cabeça programada para viver como há duas, três décadas.

Quer dizer, você já pensou sobre isso? A um ano dos meus 40, tenho me perguntado cada vez com mais frequência se me tornei a mulher que eu queria ser, se conquistei o que queria, se atingi meus objetivos e metas. Preocupações bem millennial, né? Questionamentos que se chocam com a fluidez e desconstrução de um monte de padrões e paradigmas que acontece agora.

Talvez seja só um descompasso meu, que me peguei aqui pensando nessa idade que se aproxima. No entanto, se fazer 40 ainda é uma questão para as mulheres, isso é sinal que há muito mais coisas nesse baú que precisam ser mexidas. E eu comecei a olhar para elas. Vamos juntas?

* As opiniões aqui expressas são da autora ou do autor e não necessariamente refletem as da Revista AzMina. Nosso objetivo é estimular o debate sobre as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

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