Em 2024, a Seleção Brasileira de Futebol Feminino tem um novo grande desafio: os Jogos Olímpicos de Paris. Depois do fiasco que foi a participação do Brasil na Copa do Mundo deste ano, eliminado na fase de grupos, muitas mudanças rolaram na seleção.
A mais importante delas foi a chegada de Arthur Elias para o comando da comissão técnica. Antes de assumir a seleção, para substituir a sueca Pia Sundhage, Arthur foi o treinador multicampeão do Corinthians feminino.
Ao lado de Cris Gambaré, gerente da modalidade no time paulista, Arthur mudou a forma como o futebol feminino era visto no país. E isso aconteceu antes mesmo da obrigatoriedade da profissionalização do futebol feminino nos clubes brasileiros em 2019 pela confederação e pela CONMEBOL – que fez todos os times criarem, ou reativarem, seus elencos femininos como critério obrigatório para participação na Libertadores.
Pelo Corinthians feminino, Arthur conquistou 16 títulos, entre eles: cinco vezes campeão brasileiro (2018, 2020, 2021, 2022 e 2023), quatro vezes a Libertadores da América (2017, 2019, 2021 e 2023), duas vezes a Supercopa (2022 e 2023) e três vezes o campeonato paulista (2019, 2020 e 2021).
O treinador ideal
A chegada de Arthur Elias na seleção foi muito comemorada por todas as pessoas que apoiam e acompanham o futebol feminino, entre torcedoras e imprensa. Inclusive teve muita gente pedindo essa contratação antes do ciclo da treinadora Pia.
Apesar do imenso carinho que Arthur tem pelo Corinthians e pela torcida corintiana, ele aceitou o desafio com a seleção feminina e fez promessas importantes logo no dia em que foi apresentado.
“Tenho certeza de que poderemos em pouco tempo mudar a realidade do futebol feminino no Brasil. A minha missão é trazer resultados já a curto prazo, nos Jogos Olímpicos. A seleção brasileira precisa voltar a ser protagonista mundial, esse é o nosso objetivo“, afirmou durante sua apresentação.
Na primeira convocação, Arthur mostrou que veio para mudar o futebol feminino mesmo. Ele corrigiu, por exemplo, um dos maiores erros de Pia: não levar Cristiane para a seleção. Ela e Marta, ao lado de diversos nomes da nova geração do futebol feminino, fizeram seu primeiro treino em setembro.
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De lá para cá, a nova seleção, já com a cara de Arthur Elias realizou cinco amistosos. Apesar do pouco tempo, o time já se mostra completamente diferente daquele que jogou a Copa do Mundo, principalmente em relação à postura em campo.
Os Jogos Olímpicos de Paris já começam em julho de 2024. Ao todo, Arthur terá apenas 10 meses para preparar a seleção e mostrar que, sim, o Brasil será capaz de encarar as grandes seleções e finalmente trazer uma medalha de ouro para casa.
Quem acompanhava Arthur no Corinthians, como é meu caso, que já assistiu às partidas desse elenco no estádio, sabe que ele é capaz de fazer o impossível. Em 2022, a maioria das jogadoras titulares tiveram lesões sérias e ele precisou improvisar com o elenco de base. O time perdeu campeonatos importantes, mas ganhou a Supercopa e o Brasileirão do jeito mais Corinthians possível: na raça.
O ano (mais que) perfeito do Corinthians
Arthur levou o Corinthians feminino para todos os pódios possíveis em 2023. O time foi perfeito em todas as competições que participou. Foram quatro títulos disputados e quatro troféus levantados.
Mas nem tudo foi tranquilo para esse elenco. No começo do ano, após ganhar o bicampeonato da Supercopa feminina em cima do Flamengo, as jogadoras precisaram se posicionar fortemente contra um dos maiores absurdos da história do clube: a contratação de Cuca para a equipe masculina, treinador condenado por estupro.
O lema do Corinthians feminino é “Respeita as Minas”. Justamente por isso que as mulheres, também não silenciaram. Todas as jogadoras se posicionaram em suas redes sociais, em um protesto combinado, para impedir que esse absurdo continuasse no Corinthians masculino. E deu certo. Após duas partidas, Cuca não seguiu no time.
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Foi com esse ideal que o clube conseguiu engajar sua torcida para lotar estádios jogo após jogo, batendo recordes sul-americanos, para apoiar o elenco das “Brabas” – como as jogadoras são carinhosamente chamadas pela torcida.
Mas, com a queda do treinador, elas conheceram uma parcela (pequena, felizmente) da torcida que trocou o amor pelo ódio. As Brabas receberam enxurradas de mensagens de ódio e, inclusive, ameaças de morte.
Para o azar dos machistas de plantão, infiltrados na torcida que sempre lutou pelos direitos humanos e pela democracia, essa onda negativa não abalou em nada o elenco comandado por Arthur Elias. Ele transformou as críticas em mais vitórias, mais títulos e, ainda mais, público no estádio.
Novo recomeço para o feminino
Na final do Brasileirão, contra a gigante Ferroviária, mais um recorde batido: 42 mil pessoas no estádio. O maior público da América do Sul na história do futebol feminino. Esse é o poder do Corinthians, que, hoje, além de entregar seu treinador para a Seleção, tem diversos nomes vestindo a camisa amarelinha, como a goleira Letícia Izidoro, as laterais Tamires e Yasmim Ribeiro, as meias Luana Bertolucci e Duda Sampaio, e a atacante Gabi Portilho.
Na conjuntura atual, a Seleção Feminina tem muita chance de fazer um ciclo perfeito para Marta finalmente encerrar sua trajetória com camiseta amarelinha.
Marta se despediu da Copa do Mundo esse ano e, ao que tudo indica, se despedirá dos Jogos Olímpicos em 2024, mas, se tudo der certo (e eu acredito que dará), ela poderá subir no lugar mais alto do pódio pela primeira vez vestindo a camisa do Brasil.
É preciso investir integralmente no futebol feminino, desde uma boa estrutura para os treinamentos e para os jogos, até uma equipe preparada e forte. Com a valorização e o cuidado necessário, o futebol feminino brasileiro só tem a ganhar.