O divã hoje é da Lívia Mota.
P arei de comer. Simplesmente. Parei de comer. Nada mais descia. O prato, cheio, me assustava. A comida me dava aversão. Parei de comer. Não tinha fome. Apetite. Água na boca. Parei de comer e parei de escrever. Parei de comer porque tinha medo. Medo de colocar tudo pra fora. Medo do vômito, basicamente. Parei de escrever porque tinha medo de colocar tudo pra fora. Medo das palavras dos outros, basicamente. Já faz mais de um ano. Começou lá fora ainda. O pânico começou quando morava na Alemanha.
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Me casei e fui morar lá. Foram dois anos e três meses. Dois anos e três meses de muitas mudanças. Transformações internas e externas. Dois anos e três meses de muitos desafios. Nunca tinha ficado mais de 100 quilômetros longe da minha família. Nunca tinha ficado mais de uma semana sem ver meus pais. Nunca tinha saído do Brasil. Nunca tinha casado. Tudo era incrível e assustadoramente novo para mim. Diante dessas novidades todas, senti o baque. Um sentimento de tristeza me tomava muitas vezes. No início, parecia inofensiva e passageira. Depois, evoluiu para um desespero. Até que desencadeou esse medo. O medo de passar mal. Um medo que me impedia de comer.
Foram dez quilos perdidos. Muitas roupas perdidas. Muitos olhares desconfiados. Olhares de pena. As pessoas te julgam. Não adianta. Ou te condenam à morte ou acham que é frescura. Fiz inúmeros exames. Passei por muitos médicos. E nada. Não tinha nada de errado com meu corpo. Minha saúde física estava em ordem. E eu nunca tive problemas com meu corpo. Eu não comia não por vaidade. Eu não comia porque eu não conseguia. Já no Brasil, procurei um psiquiatra. O diagnóstico foi de depressão, associada à síndrome do pânico. Mas meu medo não era de morrer. Era de passar mal.
A depressão pode ser encarada de várias formas. Eu decidi encará-la como uma forma de me conhecer de novo. De vasculhar lugares esquecidos. Decidi encará-la com coragem.