O Divã de hoje é da Andréa Romão, que também escreve uma ficção aqui e tem um canal de Youtube sobre sexo, o Kama Sussa.
Falar de sexo está na moda.
Não sei se era simplesmente porque eu era mais nova, mas na minha pós-adolescência e início da vida adulta não se falava tanto de sexo quanto hoje. E com tantos detalhes.
Fico pensando que se eu tivesse vivido o início da minha vida sexual hoje, com tanta informação, tantos textos e tanta gente falando mais abertamente do assunto, teria sido melhor. E pior.
Lembro como se fosse ontem do dia que eu e minhas amigas descobrimos o que era um “boquete” e “sexo anal”. Nós tínhamos por volta da 15 anos e éramos com certeza as meninas mais atrasadas da nossa turma da escola em termos de sexualidade. Lembro que conversamos sobre essa recém descoberta, trancadas no quarto, aos cochichos. Estávamos bem horrorizadas tanto com a perspectiva de colocar um pênis na boca quanto com a de deixar um homem enfiar um pênis no nosso ânus. Lembro que falamos que nunca faríamos isso. Não era uma promessa de adolescente. Era uma certeza. Era nojento demais. Até fizemos um jogo do tipo “se você tivesse que fazer um dos dois, qual você escolheria?”. Não lembro a resposta, mas com certeza foi uma escolha dolorosa para nós. As duas opções pareciam repulsivas demais.
Com o tempo a gente muda de opinião e começa a ver as coisas diferentes. Amadurece. Para de ver sexo como algo “nojento”. Faz sexo. Muitas vezes morrendo de vergonha na(s) primeira(s) vez(es). Depois perde a vergonha. Começa a se sentir mais vontade. Começa a gostar. Aprende a sentir prazer.
Eu fiquei muito tempo empacada entre o “começar a gostar” e o “aprender a sentir prazer”. Na época eu achava que eu gostava. Mas dizer que eu sentia prazer, já era certo exagero. Depois de um tempo fui entender que até o “gostar” era um excesso. Eu estava confundindo as coisas. Gostava de estar com aquela pessoa, mas o ato sexual em si era muito pouco agradável pra mim.
Quando finalmente chega o momento em que a gente consegue sentir prazer e se sentir a vontade pra fazer e falar de sexo, parece que finalmente alcançamos aquilo que as pessoas chamam por aí de liberdade sexual. Afinal temos uma vida sexual ativa (com um parceiro fixo ou vários diferentes), damos prazer ao outro, mas também sentimos prazer, falamos abertamente de sexo em mesa de bar. Mas é exatamente quando atingimos essa etapa de suposta libertação que corremos o risco de sermos aprisionadas pelo sexo.
É quando convencem a gente que papai-e-mamãe é coisa de gente sem sal. Que o sexo que você faz não é suficiente. E que existe um mundo de posições, situações e coisas sexuais que você PRECISA fazer.
Guardo com muito carinho lembranças de “inovações” sexuais que eu fiz. Foram muitas experiências maravilhosas, libertadoras, divertidas. Sempre respeitei meu próprio tempo. E, se por um lado o resultado não era tudo o que eu esperava, nunca foi doloroso, sofrido ou angustiante. Porque sempre foram coisas que eu estava pronta para fazer.
Mesmo eu sendo o que os outros chamam de “cabeça aberta” nunca esqueço que ninguém tem a obrigação de ser como eu. De querer fazer as coisas que eu fiz/faço.
Quando escrevo sobre sexo sempre tento fazer com cuidado, com carinho. Eu não sei quem vai ler isso. Eu não sei se a minha próxima leitora tem 26 ou 16.
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Infelizmente o mundo não é tão delicado assim. Somos massacradas com novidades e novas tendências do universo do sexo o tempo todo. Vão te dizer que a moda agora é fazer ménage, que transar em lugar público é bom pra manter o fogo do seu relacionamento, que assistir o parceiro comendo uma menina é super excitante, que fazer sex tape é prova de amor, que todo mundo manda nude e já é super normal, que casa de swing é um lugar ótimo para variar o namoro e que pagar boquete no banheiro da balada até menina de 15 anos já pagou. As pessoas falam disso o tempo todo, as amigas fazem competição pra ver quem já fez mais coisas diferentes e do outro lado rola aquela pressão do parceiro.
E quando você percebe, está fazendo coisas que não queria. Embarcando muitas vezes em situações que vão te machucar, que vão deixar cicatrizes sabe-se lá por quanto tempo.
Espera. Para. Você está confundindo liberdade sexual com obrigação de fazer coisas novas no sexo. E sem perceber você se encarcerou em uma jaula com tantas outras pessoas que acreditam que sexo só vale se for assim: diferente, ousado, “incomum”.
Você não precisa fazer isso. Você não precisa fazer nada disso. Você não precisa dizer “sim” só para agradar seu parceiro. Ou ter aprovação dos seus amigos. Você não precisa fazer nada que os outros dizem que já é “super normal” se não é normal para você.
Você só precisa fazer o que você quer. E se o que você quer é fazer papai-e-mamãe pelo resto da vida – porque pra você não existe coisa mais gostosa – vá em frente e faça. Mas se um dia você sentir que está pronta e resolver experimentar, sei lá, um ménage, experimenta. E se sentir que nunca vai estar pronta, apenas não faça e pronto. E isso sim é liberdade sexual. Escolher quando, onde e com quem serão as suas novas experiências no sexo.