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7 de outubro de 2021

Mulheres têm autonomia para decidir sobre seus corpos

Campanha pressiona convênios médicos e SUS a se posicionarem sobre exigência de autorização do marido para colocação do DIU

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Coluna NOSSAS DIU

Já imaginou se você precisasse de autorização do marido para comprar uma cartela de anticoncepcional na farmácia? Parece absurdo, mas episódios ocorridos desde agosto deste ano, envolvendo autoridades públicas e privadas no Brasil, revelam um cenário tão chocante quanto esse. Uma reportagem da Folha de São Paulo apontou que diversos planos de saúde exigiram que mulheres casadas apresentassem autorização de seus esposos para inserção do método contraceptivo DIU (dispositivo intrauterino). Detalhe: a exigência é ilegal

Após a notícia, o Procon-SP notificou mais de uma dezena de planos de saúde para que explicassem sobre a exigência do termo de consentimento. Estamos falando das maiores empresas do ramo no Brasil, com presença em grandes capitais e alcance nacional – orçamentos bilionários em nome da saúde das pessoas.

A denúncia se estende ao SUS (Sistema Único de Saúde). Pelo menos 7 UBSs (Unidades Básicas de Saúde) na cidade de São Paulo fizeram a mesma exigência de autorização do cônjuge, segundo a imprensa. Em quantos outros lugares isso acontece? Quantos postos de saúde, ambulatórios e hospitais públicos cobram que a decisão sobre inserção do DIU em mulheres seja feita pelo marido? Quantas mulheres têm, todos os dias, sua autonomia reprodutiva cerceada?

Não sabemos. Mas esta ilegalidade é uma face do machismo na sociedade, na medida em que mulheres não seriam capazes de decidir sobre sua própria saúde.

MEU CORPO, MEU DIU

Contra essa prática, foi lançada no dia 10 de agosto a campanha de pressão Meu Corpo, meu DIU. Exigimos que 10 grandes convênios de saúde viessem a público dizer se exigem ou não consentimento dos maridos para colocação de DIU em mulheres. Todos já foram notificados pelo Procon-SP.

Os convênios de saúde cobrados pela campanha são: Unimed, QSaúde, SulAmérica, Bradesco Saúde, Sompo Saúde, Porto Seguro Saúde, Golden Cross, Omint, Amil e Grupo NotreDame Intermédica. 

A mobilização permitiu que defensores dos direitos das mulheres lotassem a caixa de entrada das ouvidorias dos planos de saúde e até mesmo dos presidentes das empresas para pedir respostas. As apoiadoras da campanha manifestaram, inclusive, que são clientes de alguns dos convênios e que saber a respeito do procedimento seria fundamental para elas.

Apoiadoras da campanha Meu corpo, meu DIU cobram resposta da NotreDame Intermédica no YouTube.  Crédito: Reprodução

“NotreDame, se posicione publicamente sobre a exigência do marido autorizar colocar o DIU. Essa decisão cabe a quem irá utilizar o dispositivo, ou seja, a mulher. Pare de ignorar esse fato e assuma seu papel final de cuidar da saúde de todos”, afirmou a apoiadora Andreza Miranda, junto a 149 pessoas que deixaram comentários em um dos vídeos do YouTube da referida empresa.

Nós cobramos os convênios médicos, assim como milhares de mulheres, por vários canais de comunicação: Instagram, YouTube, WhatsApp, e-mail, telefonemas… O coro é claro: se o corpo é das mulheres, por que são os homens que decidem sobre os métodos contraceptivos delas?

Leia mais: Conheça os termos que conservadores querem excluir do dicionário do Congresso

Novas leis

Projetos de Lei no Congresso, nas Assembleias Legislativas e em Câmaras Municipais têm sido propostos com o objetivo de evitar que aconteçam exigências de autorização do marido para decisões contraceptivas reversíveis (como é o caso do DIU). Um exemplo é o PL 2719/2021, em debate na Câmara dos Deputados, que veta que planos de saúde exijam autorização do companheiro, e está aguardando designação de relator na Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher.

Apesar de já ser ilegal a prática da exigência da autorização, parlamentares entendem que é necessário mais clareza e buscam dar mais segurança às mulheres.

Exigir de mulheres adultas um termo assinado pelo marido é tão absurdo hoje quanto foi, no passado, a exigência de autorização dos maridos para que nossas avós pudessem viajar, dirigir ou trabalhar. A autorização do cônjuge para a inserção do DIU infantiliza mulheres, como se seus corpos não lhes pertencessem, como se precisassem ser eternamente tuteladas por um outro (no masculino mesmo, um homem). 

Além das barreiras impostas pelos planos de saúde, existem muitas outras ainda mais básicas, como o próprio acesso à informação. A falta de educação sexual nas escolas, somada a um ambiente cada vez mais conservador, acaba alienando as mulheres do próprio corpo, e cria obstáculos para escolhas mais conscientes e informadas sobre sua saúde reprodutiva. 

Leia mais: Ministério da Saúde não compra DIU para o SUS

Respostas das empresas

Graças a quase dois meses de pressão na campanha Meu Corpo, meu DIU, todas as empresas se pronunciaram publicamente contra a exigência de autorização do marido para colocação do DIU. Até então, muitas delas só haviam falado individualmente com jornalistas ou com órgãos estatais – mas não haviam feito anúncios públicos de que descartam esta prática.

As respostas públicas não evitam a repetição de casos futuros, mas podem trazer o tema para um debate amplo – e envolver as empresas, cobrando que revejam práticas machistas e sigam a lei. Isso é fundamental para enfraquecer a sociedade patriarcal em que vivemos. 

A Amil inicialmente ignorou os apelos via redes sociais da campanha. Faltava um pronunciamento ao público, que foi enviado à equipe do NOSSAS via e-mail: “A Amil informa que não realiza qualquer exigência para que mulheres apresentem documento de consentimento do companheiro para inserção do dispositivo intrauterino (DIU).  Reforça, ainda, que tal prática não tem qualquer respaldo legal ou regulatório”.

Procurada via redes sociais, a Golden Cross entrou em contato via e-mail e WhatsApp com a equipe do NOSSAS com a seguinte resposta pública: “A Golden Cross enviou nota para o PROCON SP e Minas Gerais nas últimas semanas explicando que não compactuamos com esse tipo de conduta e ressaltamos que a decisão de colocar o DIU – um método contraceptivo temporário – é única e exclusivamente da mulher, com a orientação de um profissional médico. Portanto, a Golden Cross respeita e incentiva essa autonomia, não exigindo consentimento do cônjuge para a implantação do dispositivo. “

O Grupo NotreDame Intermédica inicialmente ignorou os apelos dos ativistas em seu canal de YouTube e também os e-mails disparados pela campanha. Em um contato com a equipe do NOSSAS, a empresa respondeu: “A conduta do Grupo NotreDame Intermédica está aderente às regras da ANS, do Ministério da Saúde, Ética Médica, contrato e respeita a condição e dignidade de todos os públicos com quem interage. O Grupo NotreDame Intermédica não exige qualquer consentimento dos maridos autorizando a inserção do dispositivo intrauterino (DIU).”.

A Unimed se posicionou em nota oficial divulgada em seu site. 

Já a Bradesco Saúde informou que “apenas confere o requerimento solicitado por médico assistente, desde que haja cobertura contratual, e não é exigido quaisquer outras condições ou documentações, incluindo autorização ou consentimento do cônjuge”. Segundo o plano de saúde, para suas clientes, “a única exigência é o relatório médico com a indicação clínica”, pois há diretriz pela ANS.

A Omint se manifestou publicamente com um post no Instagram, assim como a QSaúde

Já a Porto Seguro Saúde enviou e-mail ao NOSSAS após pressão da campanha, informando que: “não faz nenhuma exigência para a colocação de Dispositivo Intrauterino (DIU). Tratamos como um procedimento habitual de saúde, ou seja, basta o pedido médico para que possamos avaliar e liberar. Ressaltamos ainda que a decisão de colocar o DIU é única e exclusivamente da mulher, com orientação médica. Não exigimos consentimento do cônjuge para a implantação desse método contraceptivo”. 

Após pressão via e-mail, a Sompo Saúde enviou resposta ao NOSSAS dizendo que “não requer o consentimento do cônjuge para autorizar a cobertura de realização dos procedimentos de implante de Dispositivo Intrauterino (DIU) hormonal e não hormonal por suas seguradas. A colocação do DIU é uma decisão da mulher e deve acontecer sob a orientação de seu médico de confiança.”.

A SulAmérica também respondeu a cada uma das 6 mil pessoas que pressionaram na campanha individualmente, encaminhando para todas elas um post no perfil do Instagram da empresa em que lia-se: “Só esse ano colocamos milhares de DIUs, todos com a escolha integral das mulheres. Afinal, saúde só é Integral se a liberdade também for”. 

* As opiniões aqui expressas são da autora ou do autor e não necessariamente refletem as da Revista AzMina. Nosso objetivo é estimular o debate sobre as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

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