Terminado o primeiro turno das eleições 2018 e, para além de todo debate, essa foi uma das eleições mais vitoriosas para indígenas e populações tradicionais, com um dos maiores contingentes de pares nossos concorrendo.
Tivemos candidatos indígenas, romanis, pescadores e geraizeiros (populações tradicionais que vivem no cerrado do norte de Minas Gerais).
Pela primeira vez tivemos uma de nós concorrendo a um alto cargo: Sônia Guajajara foi candidata a vice-presidência.
Durante muito tempo fomos tratados como curral eleitoral, unicamente vistos como um título de eleitor facilmente manobrável.
Muitas vezes fomos até questionados sobre por qual motivo temos títulos, visto que ainda somos vistos como “os outros”, os invisíveis, sem capacidade para entender de política, que ao longo dos tempos se tornou “assunto de homem ” – e cabe ressaltar que esse homem é hetero, cristão e branco.
Durante as eleições vimos esse preconceito se cristalizar na figura de Marina Silva, candidata a presidência. Gostando ou não das alianças e questões políticas trazidas por ela, Marina é uma de nós. É a mulher negra, nortista, extrativista, que teve acesso a educação tardiamente.
E questão religiosa dela, que é evangélica, acaba sendo também um reflexo da situação social que nós vivemos: onde a política não chega, chega o padre e o pastor, e são eles que têm assumido as nossas necessidades sociais.
Sônia Guajajara já é fruto da nossa segunda geração. Filhos do campo e da floresta que saíram de suas comunidades e que muito cedo foram construindo seus pensamentos políticos em âmbitos de debate.
Sônia foi minha companheira de Xingu Vivo, quando lutávamos contra uma hidrelétrica que até hoje mata e expulsa nossos parentes de suas terras históricas.
Mas mesmo no medo existe vitória.
E escrevo essa coluna emocionada pela vitória de Joenia Wapichana, a primeira mulher indígena eleita.
E quando um Estado como Roraima, aonde as tensões contra a causa indígena são seculares, elege a Joenia como deputada federal, é somente o resultado de todo nosso esforço.
Cabe também ressaltar que a maioria das representações é de mulheres, provando que subvertemos as estruturas dentro de nossas comunidades.
Durante muito tempo política foi “coisa de homem”, mas nós não desistimos, e vai ter cocar, saia, véus e mãos calejadas de trabalho.
Nós, mulheres indígenas e de populações tradicionais, existimos e vamos ocupar!