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Violência contra mulheres negras: quanto o Congresso se importa?

Maioria dos 42 entrevistados diz que o tema é prioridade, mas mulheres negras ainda são mais de 60% das vítimas de feminicídio

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Mais da metade da população brasileira se autodeclara preta ou parda, e do sexo feminino. Mas o combate à violência contra a mulher negra não parece prioridade no Congresso Nacional. Esse foi um dos temas abordados pela pesquisa Além do Plenário: gênero e raça no Congresso Nacional, parceria entre AzMina e o movimento Mulheres Negras Decidem (MND), que apontou: cerca de ¼ dos entrevistados (23,8,%) não declaram a violência doméstica contra mulheres negras como prioridade de mandato – incluindo os que preferiram não responder sobre o assunto. Além disso, 23% dos entrevistados (10 parlamentares) disseram que votariam contra a criação de delegacias especializadas em violência de gênero e raça para o atendimento a elas.

O “Além do Plenário” entrevistou 42 parlamentares federais para entender suas posições sobre gênero e raça entre abril e julho de 2023. Nossa equipe também realizou um levantamento histórico sobre 105 parlamentares de diferentes grupos políticos, com mais de 40 categorias de análise, como identidade de gênero, escolaridade, votos nas últimas eleições, doações de campanha e dos partidos, reeleição, relação com movimentos sociais, papel de liderança, proposições legislativas e discursos em plenário. Nos parágrafos a seguir, destrinchamos a atuação de Câmara e da FPE no Congresso. 

Uma das perguntas do estudo foi: “Mulheres negras são as que mais sofrem violência doméstica no Brasil e por isso exigem maior atenção no seu mandato?”. Numa escala de 1 a 5,  4,8% escolheram as opções 1 e 2 (discorda parcialmente); a opção 3 (não concorda nem discorda) foi respondida por 7,1% dos parlamentares; 11,9% não soube ou preferiu não responder; 76,2% disseram que o tema é prioridade em seus mandatos, votando em  4 e 5.

Se a percepção sugerida pelos resultados do Além do Plenário for mesmo o que pensa o Congresso Nacional, apesar de positiva, parece uma resposta insuficiente aos dados alarmantes sobre violência doméstica contra a mulher negra no Brasil. Mais do que uma declaração de prioridade, essa fatia da população precisa de ações concretas. No momento, não há nenhuma proposta legislativa em evidência nesse campo. 

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Das vítimas de feminicídio em 2022, 61,1% eram mulheres negras, e 38,4% eram brancas, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Os dados foram divulgados em julho de 2023, e mostram também que 56,8% das vítimas de estupro, incluindo estupro de vulnerável, eram mulheres negras, e 42,3% brancas. 

Atendimento para mulheres negras

Quase um quarto dos parlamentares entrevistados entendeu que a criação de delegacias especializadas no atendimento de casos violência doméstica contra mulheres negras é desnecessária. Ao todo 23,8% responderam ser contra a medida; 2,4% preferiram não responder; e os que se dizem a favor são 73,8%. A maioria dos congressistas ouvidos pelo estudo foi favorável à medida, mas é difícil justificar uma posição diferente desta.

O deputado federal Gutemberg Reis (MDB-RJ) está entre os que recusam as delegacias especializadas.  “Sou contra. Eu sou a favor da delegacia da mulher para mulheres. Brancas e negras. Acho muito importante iniciativas de proteção à violência de gênero, e de combate ao feminicídio, mas não estou de acordo com algo que separa raças”, justificou. Esse argumento foi repetido por vários parlamentares que rejeitam o atendimento exclusivo.

Há também o grupo que se colocou a favor da medida, mas defende priorizar políticas públicas efetivas de combate à  violência. “A gente só quer ampliar delegacias, ampliar a casa de acolhimento, depois que a violência já aconteceu. Eu quero entender o que nós vamos fazer antes. O que vamos promover para evitar isso”, disse a deputada federal Daiana Santos (PCdoB-RS), uma entre 27 parlamentares da Câmara dos Deputados que se autodeclaram negros.

O tema foi assunto de estudo conjunto entre pesquisadores da Universidade de Toronto, Fundação Getúlio Vargas (FGV) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A pesquisa constatou que as delegacias de atendimento à mulher têm maior eficácia para mulheres brancas, especialmente em municípios com infraestrutura precária e onde as mulheres negras e pardas têm menor grau de instrução. A pesquisa comparou dados municipais de segurança pública com informações do Sistema Único de Saúde (SUS) e do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2004 a 2018. 

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Os resultados indicaram maior efetividade das delegacias da mulher, em se tratando de violência de gênero, na comparação com demais aparelhos institucionais – como centros especializados de atendimento (Casa da Mulher), Defensoria Pública e Ministério Público.  Entretanto, a pesquisa revela que as delegacias não estão preparadas para o atendimento de mulheres negras. O cruzamento dos dados do SUS, secretarias de Segurança Pública dos Estados e do IBGE – entre 2004 e 2018 – apontou maior redução de mortes violentas entre mulheres brancas (28%) do que entre mulheres pretas e pardas (8%). 

Falta representatividade

Um dos motivos apontados é a falta de representatividade racial nos corpos policiais. Ou seja, faltam agentes, escrivãs e delegadas negras nas equipes que atendem as vítimas de violência. “As mulheres brancas são mais beneficiadas do que mulheres negras (pretas e pardas) nesse resultado. Quanto maior a representatividade entre funcionários que trabalham nas Delegacias Especiais de Atendimento à Mulher, mais efetivo é o resultado”, diz o pesquisador Paulo Avarte, da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas, um dos autores do estudo, em entrevista à AzMina. 

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Em pesquisa anterior, sobre a Vitimização de Mulheres no Brasil (março de 2023), o Fórum aponta que 29,9% das mulheres pretas e pardas sofreram algum tipo de violência. Entre as mulheres brancas, foram 26%. Entre as entrevistadas que disseram já terem sido vítimas de violência do parceiro íntimo, 45% eram negras (pretas e pardas), e 36,9% brancas. Entre as que já sofreram assédio sexual, 49,1% eram negras (pretas e pardas) e 42,2% brancas. O levantamento foi realizado em parceria com o Instituto DataFolha, em 126 municípios de pequeno, médio e grande porte, e ouviu 1.042 mulheres. 

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