Ela marcou a minha infância e adolescência com um clássico dos nossos tempos, “As meninas”, um livro encantador e mágico que fascinou todos que leram. Lygia Fagundes Telles: escritora, advogada e mulher que está indicada para concorrer ao celebrado Prêmio Nobel de Literatura que, em 115 anos de existência, só premiou 14 mulheres. Suas obras, todas com enredos extremamente precisos e encantadores, conquistaram uma legião de fãs nascidos da década de 80 em diante.
Lygia não está apenas desbravando territórios poucos explorados pelas mulheres no Nobel, ela também foi pioneira na faculdade de Direito do Largo São Franscisco, da USP, onde era a única mulher da turma. Lutou contra todos os tipos de machismo que conhecemos. Seus colegas de faculdade a perguntavam: “o que você quer aqui?”. Ela respondia, sempre: “Vim aqui para estudar, para ser uma advogada, direito que tenho”. Era uma mulher à frente do seu tempo, sem dúvida.
Foi a própria Lygia quem me contou essas histórias nas muitas felizes oportunidades que tive de vê-la pessoalmente. Tive o privilégio de acompanhar de perto essa grande mulher quando eu trabalhava na Companhia das Letras, e os direitos de sua obra de mestra foram adquiridos pela casa. Foi uma festa bonita. Dessas de se arrepiar. Ela não se cansa de falar sobre o ambiente em que viveu nos seus anos de estudante, de repetir trechos de seus inúmeros discursos ao público.
Quando fiquei sabendo da notícia da indicação, todas essas memórias vieram à tona para mim. Vem em hora certa. No momento em que as mulheres estão mostrando a cara em movimentos feministas fortes com ondas em redes sociais e mostrando a todos a que vieram. Sim, somos mulheres e estamos conquistando cada vez mais espaço em todos os ambientes que outrora eram predominantemente masculinos. E vamos ganhar cada vez mais terreno no Nobel.
É muito gratificante acompanhar todo esse processo, essa força feminina, presa há tanto tempo em nossas gargantas. Lygia deve estar contente. Está finalmente vendo o resultado daquela batalha a que se propôs lutar dentro das salas de aula, a de transformar todos os ambientes em lugares para todos os gêneros.
Dos inúmeros tabus que Lygia enfrentou de cabeça erguida, repetindo sempre as mesmas palavras fortes de seu propósito, acompanha hoje de camarote o resultado. Merecidamente leva essa indicação que mostra a importância da voz feminina também entre escritores.
Para ajudá-la nessa luta, nosso dever é ler mais mulheres, escutar as voz feminina e, como num desfile de Carnaval, deixar a “avenida” ser comandada por essas bravas guerreiras. Meu conselho fica: leiam mais mulheres. Elas têm muito a nos dizer. Vale começar pela Lygia.
Mergulhe na obra de Lygia
Porão e Sobrado, contos, 1938
Praia Viva, contos, 1944
O Cacto Vermelho, contos, 1949
Ciranda de Pedra, romance, 1954
Histórias do Desencontro, contos, 1958
Verão no Aquário, romance, 1964
Histórias Escolhidas, contos, 1964
O Jardim Selvagem, contos, 1965
Antes do Baile Verde, contos, 1970
As Meninas, romance, 1973
Seminário dos Ratos, contos, 1977
Filhos Prodígios, contos, 1978
A Disciplina do Amor, contos, 1980
Mistérios, contos, 1981
Venha Ver o Por do Sol e Outros Contos, 1987
As Horas Nuas, romance, 1989
A Noite Escura e Mais Eu, contos, 1995
Biruta, contos, 2004
Histórias de Mistérios, contos, 2004
Conspiração de Nuvens, contos, 2007
Passaporte para a China, contos, 2011