Papa ordena a padres que absolvam mulheres que fizeram aborto
Em setembro, o papa Francisco anunciou que vai permitir que padres absolvam mulheres que fizeram aborto e tenham se arrependido do ato durante o ano do Jubileu. Houve quem comemorasse nas redes sociais: estaria a Igreja Católica ficando menos conservadora?
Nós d’Azmina achamos que não há nada de novo sob o sol – ou, ao menos, nada que valha a pena celebrar. Embora respeitemos a importância que isso possa ter para mulheres católicas, não enxergamos nada de progressista em homens concedendo perdão, autorização ou licença para o que as mulheres fazem com o seu corpo — sob a condição de que elas se arrependam e por tempo limitado! Pois sim, as católicas que abortaram só serão perdoadas se se arrependerem durante o Jubileu, ou seja: entre Dezembro de 2015 e Novembro de 2016. Quem piscar perde o saldão de perdão!
Quando o papa Francisco defender que mulheres assumam posições de destaque dentro da igreja, aí quem sabe a gente possa começar a acreditar que ele é um papa amigão das mulheres… Até lá, nossa opinião é que ele é um bom relações públicas: seu objetivo é aumentar a popularidade da Igreja Católica passando uma imagem mais moderna da religião aos mais jovens.
Por fim, cabe lembrar que, mesmo que cada religião possa definir suas doutrinas e assim estabelecer o que é pecado ou não dentro daquela comunidade, direitos sexuais e reprodutivos são direitos. Devem ser garantidos em um Estado laico, independentemente do que dizem os líderes religiosos.
Mais uma mulher nerd silenciada
Se você é mulher e gosta de tecnologia, games, ficção científica e outros assuntos considerados “geeks”, manifestar seus gostos e opiniões na Internet pode tornar sua vida um inferno.
Que o diga Laura Buu. No comecinho deste mês, a autora do famoso blog geek Pink Vader publicou um texto explicando por que decidiu fechar a página de uma hora para outra, em 2013. Depois de entrar em um debate no Twitter sobre estupro, no qual defendeu que o uso de roupas provocantes não é justificativa para o crime, Laura foi alvo de uma campanha de difamação online, estimulada por blogueiros como Jovem Nerd e Bobagento. A caixa de comentários de seu blog foi inundada de mensagens machistas, como “por que você não morre logo?” e “lugar de mulher é na cama e calada”. Até o Linkedin da moça, que à época trabalhava na Coca-Cola, foi alvo de gozações: “até parece que a Coca-Cola contrataria uma feminista mal comida dessas”.
Ela não é a única. Em 2015 mesmo, a jornalista Ana Freitas publicou um texto no Brasil Post denunciando a abundância de comentários misóginos em fóruns e chats brasileiros. A reação apenas confirmou o argumento dela: Ana começou a receber pelo correio pacotes com brinquedos eróticos, esterco e livros para emagrecer. Como se isso não fosse assustador o suficiente, monitoraram os passos dela usando serviços de localização em redes sociais e ameaçaram aparecer nos mesmos lugares para “calar a boca da vadia”. Leia o relato completo da Ana aqui.
Internacionalmente, a mais conhecida vítima de ataques de ódio por parte de homens da comunidade “nerd” é a crítica de mídia norte-americana Anita Sarkeesian, num caso que ficou conhecido como GamerGate. Ela recebeu ameaças de morte devido ao sucesso de sua série de vídeos “Tropes vs. Women”, onde analisa estereótipos femininos em videogames. Assista aqui a palestra de Anita no evento TedxWomen, na qual ela comenta sobre o que passou.
O que fazer se isso acontecer com você? Além de procurar um@ advogad@, não se calar. Afinal, silenciar as mulheres é exatamente o que querem esses homens, que se sentem protegidos pela turba e o anonimato da rede. Admiramos Laura, Ana e Anita por terem a coragem de continuar se posicionando apesar das perseguições. As mulheres geeks também precisam pressionar as empresas deste mercado para que contemplem e representem melhor o público feminino, que não é desprezível. Já passou da hora de abandonarmos essa ideia boba de que ciência, videogame e ficção científica são “coisas de menino”.
Publicar ou não a foto de Aylan Kurdi?
No meio de setembro, uma foto chocou o mundo: Aylan Kurdi, refugiado sírio de apenas três anos, morto na praia de Bodrum, na Turquia. Ele aparecia de bruços, com o rosto contra a areia.
Iniciou-se um debate: será que os jornais deveriam ter publicado a foto? Houve quem defendesse a necessidade do choque para que o público ocidental privilegiado entendesse a dimensão da crise. Quando a vítima é uma criança de pele clara, parecida com os filhos dessas pessoas, a notícia adquiriria para elas uma dimensão mais humana.
Mas houve também quem achasse a foto apelativa demais e desrespeitosa em relação à memória do garoto, argumentando que quem não se abala com o abstrato (lendo notícias de refugiados morrendo às centenas) tampouco se abalaria com o concreto (a imagem do menino).
Enquanto o debate rolava, montagens com a foto original circularam na rede, como uma que representava Aylan dormindo tranquilamente em um berço. Fica a questão: embora a intenção dessas montagens seja sensibilizar o público para o horror que estão vivendo os sírios, não é preciso uma boa dose de dessensibilização para passar um bom tempo photoshopando a foto de um menino morto?
Nós d’AzMina concordamos um pouquinho com cada lado. Pelo sim, pelo não, não vamos publicar a foto. Afinal, existe alguém no mundo que não a tenha visto?
Mas não podemos nos esquecer desse assunto. Confira aqui nossa reportagem sobre as refugiadas e suas histórias.
“Que horas ela volta?” é o filme escolhido para representar o Brasil na disputa por uma indicação ao Oscar
Beijinho no ombro para Claudio Assis e Lírio Ferreira. “Que horas ela volta?”, de Ana Muylaert, é líder de bilheteria e vai representar o Brasil na disputa por uma indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Além da baita conquista de Ana, estamos encantadas pela temática do filme, que enfia o dedo em uma de nossas maiores feridas: como a cultura da casa grande e senzala ainda é forte na sociedade. Mas não vamos dar spoilers – corre você também assistir ao filme!
Dado Dolabella se diz feminista
A piada do mês: Dado Dolabella, acusado de agressão por nada menos que três ex-namoradas (Luana Piovani, Eliza Joenck e Viviane Sarahyba) e condenado por um dos casos, ressurgiu das cinzas em setembro e se declarou feminista. Ao ser questionado, criticou as “feministas bucetólogas” que não aceitam homens no movimento. Querido Dado, o problema não é você ser homem, mas sim agressor e até hoje relativizar o ocorrido, culpando as suas ex. Fica a dica! Como a Internet não perdoa, já existe o Tumblr Coisas mais feministas que o Dado Dolabella.
Senado aprova cotas para mulheres no Legislativo
Neste mês, o Senado aprovou uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que estabelece cotas para as mulheres nas eleições para deputado federal, distrital, estadual e vereador. A proposta agora segue para a Câmara dos Deputados, onde precisa passar por dois turnos de votação. A PEC estabelece cotas para as três legislaturas seguintes à sua aprovação: na primeira eleição, pelo menos 10% de mulheres eleitas; na segunda, 12%; e, na terceira, 16%. Dos 513 cargos da Câmara dos Deputados, apenas 51 foram ocupados por mulheres nas eleições de 2014. Já no Senado, são apenas 13 mulheres contra 68 homens. Na América Latina, o Brasil só perde para o Haiti em subrepresentação feminina na política. Estamos torcendo pra acabar essa vergonha!
Cunha quer forçar vítimas de estupro a ter filho do estuprador
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, quer alterar a lei 12.845, que regulamenta o atendimento de saúde a vítimas de estupro, garantindo a prevenção da gravidez (pílula do dia seguinte) e aborto caso esta falhe. O projeto de lei 5.069, de autoria de Cunha, impediria os serviços de saúde de fornecer a pílula do dia seguinte e puniria qualquer pessoa, inclusive profissionais de saúde, de dar informações à vítima sobre como evitar a gravidez. À imprensa, Cunha disse que fará tudo o que estiver ao seu alcance para “reverter esse lamentável quadro”.
Lamentável para quem? Choca-nos a falta de sensibilidade para com as mulheres vítimas de estupro. Será que Cunha não é capaz de pensar, nem por um segundo, no sofrimento delas? É tanto machismo que nós d’AzMina não conseguimos lidar… Parece que, para Cunha, mulheres não são seres humanos com sentimentos, dores e sonhos. São chocadeiras sem direito a voz ou vontade própria. Precisam ser forçadas a cumprir sua função de gerar crianças em qualquer circunstância.
Defendemos esse direito com unhas e dentes e até fizemos uma petição: cabe à cada vítima de estupro que engravida decidir o que fazer. O Estado e a sociedade devem acolher, informar e ajudar essas mulheres, em vez de julgá-las e violentá-las uma segunda vez.
O Brasil já é um dos países mais atrasados do mundo na legislação do aborto (61 países ao redor do mundo têm sistemas de saúde que o oferecem como serviço às mulheres que desejam fazê-lo – para ver as estatísticas, clique aqui. Enquanto isso, morre cerca de uma brasileira por dia em decorrência de um aborto clandestino). Cunha quer nos fazer retroceder mais ainda, eliminando até os casos em que o aborto já é permitido na lei brasileira. E infelizmente não é o único. Envergonha-nos ver tantos políticos agindo como se o Brasil não tivesse questão mais urgente para resolver do que impedir mulheres de abortar legalmente, com segurança e higiene.
Câmara aprova Estatuto da Família, que define família como homem, mulher e filhos biológicos
No finzinho de setembro, a Comissão Especial do Estatudo da Família aprovou, por 17 votos a 5, um projeto de lei que define família como um grupo de pessoas formado por um homem, uma mulher e seus “descendentes” (o que dá a entender que apenas filhos biológicos seriam considerados). A intenção é clara como água: agora que os homossexuais têm direito a se casar no Brasil, o projeto faz uma manobra para manter os heterossexuais como uma classe privilegiada, merecedora de medidas governamentais que as “protejam”.
Por ferir o princípio constitucional de igualdade, a medida provavelmente será derrubada mais tarde pelo STF. Mas o caráter simbólico da aprovação de um projeto desses na câmara é preocupante. Nós d’AzMina estamos fartas de políticos querendo impor seus preceitos religiosos a todas as pessoas: o Estado é laico! Existem milhões de famílias brasileiras que não se encaixam nesse modelo de propaganda de margarina – e não há nada de errado com elas.
De novo: parem de desperdiçar tempo e dinheiro público como se não houvesse questão mais importante do que controlar os corpos e sexualidades “desviantes”, senhores deputados.
Leia aqui o desabafo de nossa repórter especial de assuntos LGBT, Tamy, sobre esta definição.
ONU Mulheres inicia campanha pela igualdade salarial
As mulheres ganham em média 24% menos do que os homens ao redor do mundo, segundo relatório publicado este mês pela Organização Internacional do Trabalho. Na Ásia, a diferença chega a 30%. A ONU Mulheres, agência da ONU pela igualdade de gênero, decidiu então fazer uma campanha pela igualdade salarial, pressionando para que o tema seja incluído na lista de 17 Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável – os substitutos dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio.