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“Os erros da esquerda abriram espaço para a extrema direita”

A presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais da OAB/ DF até acredita na ascensão de líderes como Bolsonaro, mas acha que as mulheres não vão aceitar que direitos sejam retirados

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Advogada acredita que impeachment é necessário para proteger a democracia
Advogada acredita que impeachment é necessário para proteger a democracia

Christiane Pantoja, presidente da Comissão de Assuntos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal (OAB/ DF), até acredita que a crise política ameace a democracia, mas não teme pelas mulheres. Para a advogada, elas caminharam um longo caminho e não vão aceitar que direitos sejam retirados.

Por outro lado, para ela, que apoia o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, os erros do PT fazem com que toda a sociedade pague com um fortalecimento da extrema direita, representada por figuras como o deputado Jair Bolsonaro.

A Revista AzMina tem feito uma série de entrevistas consultando a opinião de especialistas mulheres acerca do momento político atual. Ainda nesta semana, entrevistamos a cientista política da UnB, Flávia Birolli, que tem opinião bastante divergente de Pantoja, gerando um debate muito rico protagonizado por mulheres.

Conheça melhor as opiniões de Pantoja no bate-papo a seguir.

Leia mais: Machismo nosso de cada crise política

A atual crise política tem feito com que muitos temam perder não só a democracia como direitos de grupos minoritários. A seu ver, as mulheres estão em risco?

A atual crise é o descortino, escancarado, da corrupção que sempre existiu na política brasileira e agora é protagonizada pela esquerda que, no passado, supostamente a combatia, mas hoje é partícipe incontestável da sujeirada. A esquerda que lutava pelo direito das minorias, dos programas sociais, da igualdade de gêneros, hoje, no poder, comunga da venda de votos no âmbito do Congresso Nacional, do desvio de dinheiro de contratos públicos e mantém a altíssima carga tributária e serviços públicos pífios.

A boa notícia é que a verdade foi mostrada. Estamos vendo as entranhas da cultura corrupta sem piedade. Sim, elas colocam à prova o Estado Democrático de Direito, mas, a meu ver, nossas instituições têm dado uma resposta vigorosa, assegurando o direito às intensas manifestações populares das mais diversas correntes políticas e ideológicas.

Nesse contexto, não vejo perigo à democracia ou ao direito das minorias, mas apenas a triste desilusão diante de uma mentira ideológica exposta nos tribunais e nas delegacias. Nem penso que as mulheres estejam em risco em razão da atual crise política. Não é isso que está em jogo. Ao contrário, vejo um alargamento dos debates acerca da igualdade de gêneros no atual momento histórico brasileiro . Vejo mais informação disseminadas nas redes sociais e mais mulheres com a correta percepção da existência do machismo arraigado e muitas vezes subliminar na cultura brasileira. Vejo medidas de cotas para mulheres adotadas, por exemplo, na Ordem dos Advogados do Brasil, e mais crianças educadas no espírito da igualdade. Vejo políticas de combate à violência doméstica abraçadas pelo Poder Judiciário e também pelo Legislativo quando, por exemplo, tipifica o crime de feminicídio.

As mulheres estão mais nas ruas, nas suas casas, nas instituições, em verdadeira e oportuna união pela igualdade e fim da violência.

Sua crítica à esquerda é somente ao PT ou a todos os demais partidos que assim se identificam? A seu ver, há esperança para a esquerda?

É uma crítica ao partido que hoje está no poder. O problema é cultural da política brasileira. Como a esquerda sempre se opôs à corrupção, a esperança era de que, uma vez no poder, a esquerda mudaria essa cultura. Mas isso não aconteceu.

Porém, sou otimista: acredito que a atual crise servirá à melhoria da política brasileira, inclusive da esquerda que deverá ter no PT o exemplo a não ser seguido.

Você acredita na existência de um golpe? 

Logo de início é importante frisar que a Presidente da República não será retirada à força do poder, mas, sim, julgada nos termos da Constituição da República sobre o cometimento ou não do crime de responsabilidade tipificado na lei. O direito ao pedido de impeachment foi exercido por diversas vezes na história brasileira, inclusive – e principalmente – pelo PT.

Mas a decisão das urnas não deve ser respeitada?

Com uma taxa de rejeição de mais de 70% e uma economia beirando o abismo, a saída do governo Dilma não será jamais um golpe, ou uma retirada à força. Ao contrário.

O impeachment é fundamental para a retomada do crescimento econômico e a legitimação democrática que se faz necessária não só durante as eleições, mas também no curso do mandato.

Que a nossa primeira presidenta mulher saia em maus termos do poder não pode aumentar o preconceito e a insegurança em torno de votar em mulheres?

Caso ocorra o impeachment, a meu ver, não haverá um aumento do preconceito ou insegurança quanto à participação da mulher na política. Mais uma vez, não se trata de uma questão de gênero. Trata-se, isso sim, da indignação diante das manobras escusas das instituições para manutenção do poder político a qualquer custo. Trata-se do levante da sociedade civil para declarar que nada é mais importante que a moralidade do agente político quando o assunto é políticas públicas. Não é o gênero que está em discussão: é ética, probidade e competência.

Em sua visão, é possível que líderes ultraconservadores, como Cunha e Bolsonaro, saiam fortalecidos desta disputa? Como isso afetaria as mulheres?

Infelizmente, o erro político da esquerda com o povo brasileiro, quando assumiu o poder ensejou, sim, o fortalecimento da extrema-direita. Mas é do jogo democrático. Figuras como o Bolsonaro devem permanecer onde estão, no Congresso, representando uma parcela da população brasileira e ponto. Figuras como o Deputado Eduardo Cunha, por sua vez, já respondem a processo ético na Câmara e a processo penal perante o Supremo Tribunal Federal. Se condenadas, essas figuras serão extirpadas do cenário político brasileiro, não pela força, mas pelo funcionamento das instituições.

Acredito que não apenas esses líderes políticos da direita, mas também moderados e a extrema-esquerda entrarão na arena pela conquista do voto popular.

Nesse cenário de incertezas, espero apenas que as conquistas alcançadas pelas mulheres não sejam violadas em razão da desilusão com os partidos de esquerda. É hora de reafirmar a luta pela igualdade de gêneros e de separar a imagem de nossos direitos da classe política corrupta.

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