Já se passaram 90 anos desde que as mulheres conquistaram o direito a votar e concorrer aos cargos eletivos no Brasil. Mas mesmo com quase um século de direitos políticos, a participação feminina na democracia ainda é uma luta permanente, o que se deve a uma estrutura que afasta as mulheres da política institucional o que inclui, dentre outras coisas, a violência política de gênero.
Não, não é só machismo. Essa violência pode ocorrer de diferentes maneiras, passando desde por práticas silenciosas e chegando a ataques e ameaças escancaradas. Independente de como ela acontece, uma coisa é certa: toda violência política de gênero de alguma forma afasta ou dificulta a participação de mulheres e de pessoas trans na política. Dados da União Interparlamentar de 2019 apontam que 80% das parlamentares no mundo já foram vítimas desse tipo de violência. Para 39% delas a violência afetou a sua liberdade e minou a implementação de seus mandatos.
Aqui o MonitorA, projeto da revista Azmina e do InternetLab, te ajuda a identificar algumas das diferentes formas que a violência política de gênero e a violência institucional atuam para distanciar as mulheres e as pessoas trans da política:
Violência Institucional
Nesse caso é a própria instituição, seja ela o governo ou o partido, que impede ou dificulta o exercício da política para as mulheres. Por exemplo, até 2016 as plenárias do Senado sequer tinham banheiros femininos. E foi só em 2021 que a Câmara passou a informar quando a ausência de uma parlamentar se deve à licença maternidade. Até então a ausência de mulheres por esse motivo era tratada como falta, causando cobranças e constrangimentos para as parlamentares que tiravam a licença.
Outro exemplo de violência institucional é o uso de mulheres como candidatas de fachada, também chamadas de candidaturas laranja. Nesses casos, os partidos lançam uma candidata apenas com a intenção de cumprir a cota de 30% de candidaturas femininas, mas na hora da campanha desviam os recursos e investimentos que deveriam ir para a campanha dela para outras candidaturas do partido.
Violência moral
São ameaças, xingamentos, ofensas e difamações, que podem acontecer ao vivo ou nas redes sociais. Como mostramos no MonitorA em 2020, enquanto os homens são atacados por seu trabalho e atuação, as mulheres são alvos de ataques pelo que são ou supostamente deveriam ser. Isto é, as ofensas se estruturam por meio de suas características físicas, intelectuais e morais.
Nas eleições desse ano, o MonitorA, que conta com a participação do Núcleo de Jornalismo em 2022, identificou que só na primeira semana de campanha eleitoral quase 4,5 mil ataques ou insultos foram direcionados a 97 candidatas pelo Twitter. Seja por meio de insultos ou ataques o que está em jogo é a desqualificação das candidatas: animalização, inferiorização, ofensas morais são algumas das formas de tentar atingi-las. (Para saber mais sobre a diferenciação entre ataques e insultos, clique aqui).
Violência psicológica
Ameaças e intimidações às mulheres e pessoas trans, ou a suas e seus amigos e familiares são também parte deste fenômeno social.. O medo causado pela violência psicológica pode levar as vítimas a se isolarem socialmente, afetando diretamente o seu exercício político. De acordo com levantamento da ANTRA e Distrito Drag, entre as pessoas trans eleitas, metade já recebeu alguma ameaça, incluindo ameaças de morte. E 80% delas não se sentem seguras para exercerem seus mandatos.
Violência Física
Nesse caso a violência política alcança diretamente o corpo das mulheres. Tortura, prisões arbitrárias e agressões são alguns exemplos, o que pode chegar ao nível extremo quando ocorrem assassinatos – como aconteceu com a vereadora Marielle Franco em 2018, crime que continua sem ter sido solucionado até hoje.
A violência física também pode ter caráter sexual, como assédio ou qualquer contato não consentido.
Reconhecer os diferentes tipos de violência é fundamental para poder combatê-la. Neste ano temos as primeiras eleições com uma lei contra a violência política de gênero em vigor. A lei considera crime eleitoral “assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato eletivo, utilizando-se de menosprezo ou discriminação à condição de mulher ou à sua cor, raça ou etnia, com a finalidade de impedir ou de dificultar a sua campanha eleitoral ou o desempenho de seu mandato eletivo”. É possível denunciar casos de violência política no site do Ministério Público. Para mais informações sobre como denunciar, acesse “Mulheres na Política: Guia para o Enfrentamento da Violência Política de Gênero”.