Hoje acordei num susto com a reportagem do tabloide britânico Daily Mail que comparava Marcela Temer à ex-imperatriz da França Maria Antonieta, alegando que as duas mergulhavam em luxo enquanto seu povo perecia de fome – ou desemprego. A analogia faz um mundo de sentido, mas não exatamente da maneira sugerida pelo jornal. Claro que tanto Marcela Temer quanto Marian Antonieta viveram luxos escandalosos quando se pensa na situação financeira de seus povos, e isso deve ser criticado, mas a História tem a mania de criar contos distorcidos em tornos de vilãs femininas que em muito me desagrada. Veja bem, não se trata aqui de defender o consumismo de Marcela, mas uma narrativa que coloca a mulher no papel principal de vilã, no estereótipo do inimigo.
Nem Marcela nem Maria Antonieta eram responsáveis pela situação de seu povo. Nem uma nem outra podiam sequer decidir quanto do orçamento nacional seria dedicado às suas extravagâncias. As duas estavam condenadas a uma vida deprimente de bibelô, acompanhadas por homens que achavam que elas, afinal, não precisavam de nada a não ser uma bolsa de moedas de ouro ou um cartão de crédito.
Mas não são nem Luiz XVI nem Michel Temer que se tornaram símbolos risíveis dos escândalos e do consumismo da classe política na guilhotina da História, foram as mulheres que pouco podiam fazer a respeito da situação.
Veja, tanto Marcela quanto Maria Antonieta são mais vítimas que algozes. Ambas foram transformadas em objetos de adorno por maridos e sociedades machistas que acreditam que o seu lugar era o de “bela, recatada e do lar”. Quando se protesta contra a venda de Marcela como modelo de mulher, não é contra Marcela que as feministas protestam (ou deveriam protestar) é contra a ideia de que todas nós, inclusive ela, não merecemos mais que esse espaço de coadjuvante das decisões reais.
Marcela também foi excluída deste governo de machos brancos. Marcela, com suas viagens a Nova York e reformas milionárias, não é a inimiga do povo brasileiro. Afinal, se o dinheiro público está sendo usado para esses exageros, quem o desviou para esses gastos foi Temer e não ela.
Não estou aqui dizendo que Marcela está condenada eternamente ao papel de vítima, de forma alguma. Marcela é ser pensante e cabe a ela fazer a autocrítica de se reinventar enquanto sujeito e não objeto da história. Cabe a ela analisar os próprios gastos e comportamentos incompatíveis com qualquer ser humano com senso de justiça social e um coração pulsante.
Mas eu me recuso a colocá-la no papel de vilã protagonista quando não damos a nenhuma mulher protagonismo igual na tomada de decisões.
Marcela não é minha arquinimiga e não deveria ser a sua. Como fizeram com Maria Antonieta, querem te fazer acreditar que o mau do mundo vem somente das mulheres. Não compre essa balela.